FOLHA DE LONDRINA
CRACK A PIOR DELAS
Gustavo Carneiro 20-05-2017
Dados do Observatório do Crack apontam que dos 5.570 municípios brasileiros, 1.154 apresentam situação de alerta para problemas relacionados à droga
Carlos (nome fictício) tem 32 anos. Aos 15, teve o primeiro contato com as drogas. De lá para cá, o vício só fez aumentar. Hoje, ele é um dos sete moradores do posto de combustíveis abandonado na avenida Dez de Dezembro, ao lado do Terminal Rodoviário de Londrina. Ouvido pela FOLHA em reportagem publicada em 30 de maio, disse já ter perdido qualquer esperança de se livrar do pesadelo do crack. Segundo relatório divulgado recentemente pela ONU (Organização das Nações Unidas), assim como Carlos, 250 milhões de pessoas em todo o mundo consumiram algum tipo de droga em 2015, o que representa 5% da população mundial.
O Relatório Mundial sobre Drogas da ONU, divulgado em Viena, na Áustria, mostra especial preocupação pela situação de 29,5 milhões de pessoas que sofrem com transtornos graves pelo consumo de drogas, incluída a toxicodependência, e que são os mais vulneráveis. O estudo também mostra que pelo menos 190 mil morreram neste mesmo ano por causas diretas relacionadas com entorpecentes. Uma das maiores dificuldades ainda é o acesso ao tratamento. Só uma de cada seis pessoas que requer tratamento por estes transtornos recebe assistência, a maioria nos países desenvolvidos, aponta o reporte elaborado pelo UNODC (Escritório das Nações Unidas contra a Droga e o Delito).
A maconha é a droga mais consumida, com 183 milhões de usuários em 2015, mas os opioides, entre eles a heroína, seguem sendo as substâncias mais nocivas e as que causam mais mortes. No Brasil, o crack é a droga de grande efeito nocivo mais alastrada. Segundo o Observatório do Crack, ligado à CNM (Confederação Nacional de Municípios), dos 5.570 municípios brasileiros, 1.154 apresentam situação de alerta para problemas relacionados ao crack, seja nos setores de segurança pública, saúde e assistência social. O Paraná tem 93 municípios que apresentam alto nível de problemas relacionados ao consumo da droga.
O superintendente de Atenção à Saúde da Sesa (Secretaria de Estado da Saúde), Juliano Gevaerd, lembra que, atualmente, não há fronteira geográfica para o alcance das drogas. "Antes, o problema era concentrado nos grandes centros, mas há mais de uma década já temos outra realidade. Isso exige maior esforço para que a rede de saúde mental chegue até aos pequenos municípios", detalha. Segundo Gevaerd, o atendimento é feito nas unidades do Caps-AD (Centro de Apoio Psicossocial – Álcool e Drogas), hospitais psiquiátricos e em hospitais gerais com leitos de saúde mental.
A rede estadual tem 24 Caps-AD. Gevaerd admite dificuldades em expandir o serviço para pequenos municípios. "Assim como nas outras especialidades da área da saúde, temos uma concentração desses profissionais nas grandes cidades. Para compensar isso, apostamos nos arranjos regionais, que prevê inclusive moradias temporárias para a recuperação dos pacientes", conta.
De acordo com o superintendente, o combate às drogas, que inclui a prevenção e o tratamento, deve ser feito de forma intersetorial. "É uma questão complexa que exige comprometimento de vários setores como Educação, Assistência Social, Segurança e Saúde. Temos trabalhado assim e conseguido uma resposta adequada", considera.
PSEUDOTRATAMENTO - O diretor da APPSIQ (Associação Paranaense de Psiquiatria), Ricardo Assmé, acredita que uma parcela da população subestima os riscos do consumo das drogas. "Claro que temos vários tipos de drogas e há aquelas mais nocivas, mas se pegarmos a maconha, por exemplo, que tem apelo midiático e é considerada inofensiva, principalmente pelos jovens, vemos que há muita desinformação. A maconha é a droga que mais contribui para casos de esquizofrenia", alerta.
Assmé também comenta sobre a dificuldade de acesso ao tratamento e critica o modelo atual. "O procedimento do Caps é de redução de danos. O paciente fica lá das 8h às 16h, torna a consumir drogas e volta no outro dia para tomar café da manhã. É um pseudotratamento. É um sistema que incomoda, mas ainda não encontramos uma alternativa viável. É preciso mais discussão em torno do tema", sugere.
O psiquiatra expõe ainda que alguns hospitais gerais que têm leitos de psiquiatria se recusam a receber pacientes dependentes de drogas, que muitas vezes precisam de intervenção judicial para obter vaga. "Esses hospitais, muitas vezes, são o único recurso, pois o acesso ao Caps é limitado às maiores cidades", diz. Assmé defende também a maior capacitação de médicos do interior para trabalhar com este público. "É um cenário complexo que passou por grandes transformações nos últimos anos e que demanda de atenção do poder público", observa.
Ainda segundo o relatório da ONU, o número de consumidores de drogas se mantém estável há cinco anos, mas os responsáveis pelo relatório advertem que o mercado das drogas está se diversificando com o surgimento de novas substâncias, mais potentes e perigosas. "Aumentou a situação de risco para a saúde pela diversificação e a potência de novas substâncias", explica Angela Me, coordenadora do relatório. Com Agência Brasil
Celso Felizardo
Reportagem Local
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