sexta-feira, 5 de junho de 2015

AMBIENTALISTA DE VERDADE EM LONDRINA

FOLHA DE LONDRINA

PERSONAGEM - O jardineiro fiel

Aos 88 anos, todo santo dia José Gomes percorre o centro de Londrina de olho em tudo o que precisa de uma boa poda


Aos 88 anos, completados em março, José Guilhen Gomes garante ter lembranças de quando tinha três meses de idade e a família morava em um sítio em São Manuel do Paraíso, na região de Bauru (SP). José Gomes diz se lembrar dos irmãos mais velhos brincando perto de uma mina e de um deles ter levado um escorregão. Conta também detalhes de outro episódio da época em que era bebê: a viagem de trem que levou sua família de São Manuel – terra natal da dupla Tonico & Tinoco, do ex-governador paulista Laudo Natel e do goleiro Zeferino Pasquini – até João Ramalho, próximo a Presidente Prudente.


José Gomes mora hoje em um edifício antigo no centro de Londrina e tem algo de que nunca se esquece: todos os dias, desde que não chova forte, ele deixa o apartamento na Rua Professor João Cândido e percorre as calçadas do quadrilátero central da cidade em busca de plantas que necessitam de poda e de pequenos espaços que imploram por um serviço de jardinagem.

Para isso, há outra coisa inesquecível para o fiel jardineiro: a tesoura de poda que, embrulhada caprichosamente em um invólucro feito de papel jornal, divide espaço nos bolsos da calça com documentos e algum trocado. Se vê um trabalho que necessite de mais ferramentas, José Gomes marca na memória e retorna no dia seguinte munido de facão, serrote e tesourão.

– É bom ter a tesoura no bolso porque resolvo na hora.

O alvo de José Gomes são arbustos plantados aos pés de árvores grandes, pequenos jardins de edifícios e lojas, a Praça Sete de Setembro e o Bosque e, ainda, árvores de pequeno porte cujos galhos incomodam motoristas nas ruas e pedestres desatentos nas calçadas. Ligeiro, ele trepa nos grandes vasos para podar as pequenas palmeiras que ornamentam a Rua dos Pioneiros, defronte à Concha Acústica.

Além de fiel, o jardineiro é caprichoso:

– Podo, pico, ponho no saco e deixo pro caminhão (da prefeitura) levar.

Muitos dos que frequentam o centro já testemunharam o diálogo inicial de José Gomes com algum morador, síndico ou lojista da região. "Posso podar aqui?", é o questionamento direto deste homem franzino, filho de espanhóis. "Não tenho dinheiro para pagar", é quase sempre a resposta do interlocutor. "Não tem importância, só quero podar", ele arremata.

Quando percebe que as calçadas da Hugo Cabral, Sergipe, Pará, São Paulo, Rio de Janeiro e outras estão ok, José Gomes ruma para a Praça Sete de Setembro, Praça da Bandeira ou para o Bosque, onde já realizou diversos trabalhos. E se lá também estiver tudo bem, ele ruma para o cemitério São Pedro.

Os cuidados com as plantas ele diz ter aprendido no tempo em que morou em um sítio de 2,5 alqueires que, em 1937, o pai comprou na região onde hoje é a Vila Santa Terezinha. Cultivavam 800 pés de café, além de horta e pomar. Até se aposentar, o ofício de José Gomes foi a marcenaria. Montava jardineiras para a Viação Garcia e persianas para casas e estabelecimentos comerciais, como o Hotel Bourbon. Gostava de trabalhar com caviúna. Foi com essa madeira que, em 1950, antes do casamento, construiu os móveis que adornam o apartamento onde mora com a esposa Olga.

José Gomes também cultiva horta em um terreno da família, perto do Iapar. Maços de cebolinha, salsinha, alho poró e sacolas de tomates ele dá de presente a vizinhos e comerciantes. Por conta do abastecimento regular de cheiro verde, dias atrás ele ganhou uma garrafa de vinho de uma casa de massas.

– Para a horta eu vou e volto de ônibus. Não pago mesmo...

A poda é importante, seo José?
– Ah, é. Fica mais bonito.
Mas o senhor não está fazendo um serviço que, muitas vezes, deveria ser da prefeitura?

– Eu vejo o que precisa fazer e faço. Não espero ninguém.

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